Lixo espacial torna-se preocupação internacional

Lixo espacial

O avanço tecnológico, com a criação dos programas espaciais e dos satélites, permitiu ao homem usufruir de serviços considerados importantes como as telecomunicações, a geração de dados e de imagens da Terra e do espaço, e a previsão do tempo, apenas para citar alguns.

Grande parte dos registros históricos na área ocorreu nas últimas décadas do século 20. A primeira década deste século serviu de reflexão sobre a necessidade de maior controle da atividade, em especial, diante do acelerado crescimento no volume de detritos lançados na órbita terrestre – satélites desativados e restos de foguetes e de equipamentos que ameaçam a segurança do sistema, o chamado lixo espacial.

Reentrada da MIR

Neste mês, comemora-se quase uma década de uma das maiores demonstrações de engenharia espacial e controle de artefatos à distância. No dia 23 de março de 2001, a Rússia decidiu destruir a estação espacial Mir (Paz em russo), depois de 15 anos em órbita, mais de três vezes o tempo previsto inicialmente para a sua vida útil.

O gigante de 137 toneladas retornou a Terra com manobras controladas por técnicos da Agência Espacial Europeia (ESA). A estação estava a 320 km da superfície e foi conduzida em direção à atmosfera. O choque com as camadas superiores provocou explosões e a sua queima. Os restos da Mir caíram sobre uma área do Pacífico Sul, entre a Nova Zelândia e o Chile.

“A reentrada da Mir foi executada com segurança e precisão – um final apropriado para o seu recorde impressionante”, disse Frank Longhurst, da direção da agência russa Moscovo, responsável pelo controle da missão. Assim, finalizou-se com sucesso a trajetória da estação russa, que teve o seu primeiro módulo lançado em 1986; pela qual 105 cosmonautas, dos quais 81 não russos, de 11 nacionalidades, tiveram a chance de voar entre 1988 e 1999.

Um ano antes do objeto mais pesado lançado ao espaço voltar a Terra, a NASA realizou o seu primeiro retorno orbital completamente controlado.

Também foi no mês de março (de 2000) que engenheiros e cientistas da organização começaram os preparativos para a descida gradual do Observatório de Raios Gama Compton, de 17 toneladas, para o Oceano Pacífico.

Experiência brasileira

Dois significativos objetos que deixaram de fazer parte do conjunto de detritos que formam o chamado lixo espacial, uma das grandes preocupações deste século – veja Lixo espacial e clima espacial entram na pauta da ONU.

O pesquisador Marcelo Souza, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em São José dos Campos (SP), lembra que o Brasil tem acompanhado as ações internacionais de controle dos detritos. Em abril de 2003, um pequeno grupo de técnicos pode observar a trajetória de reentrada do satélite BeppoSax. Construído e lançado por companhias italianas e holandesas, em 1996, com finalidade parcialmente científica e para estudar os raios X emanados do espaço cósmico.

A equipe recebeu as informações da Agência Espacial Italiana (ASI) e, ao refazer os cálculos, conseguiu prever a queda no Oceano Pacífico com quase uma hora de antecedência em relação às informações oficiais. Representantes da Nasa também estiveram no Brasil, em outubro de 2000, para apresentar detalhes da operação do Compton.

Mapa do lixo espacial

De acordo com o primeiro relatório divulgado neste ano pela Nasa, o volume de lixo espacial aumentou quase 20% em 2009 em relação ao ano anterior. O levantamento trimestral detectou em torno de 15 mil objetos ao redor do planeta, desde seção de foguetes a fragmentos diversos.

Em 2008, foram observados 12.743 resíduos. A avaliação é feita usando radares e telescópios óticos e análise de superfícies da nave em seu retorno do espaço. As informações sobre cada satélite fragmentado são descritas juntamente com as suas características orbitais, incluindo o número de detritos gerados.

No relatório da Nasa para os detritos espaciais (Nasa Orbital Debris Program Office) é feita a contabilidade do lixo e apontados os maiores responsáveis pela sua existência. Dos 15.090 objetos que se encontram na órbita terrestre, 5.653 teriam sido de artefatos lançados pela Commonwealth of Independent States (CIS), seguida dos Estados Unidos, com 4.812 e da China, com 3.144. A Agência Espacial Europeia (ESA) aparece como a entidade que menos produz lixo, responsável por 85 objetos no espaço.

Meio ambiente espacial

O crescimento do número de detritos é acompanhado pelo avanço dos programas espaciais. O pesquisador Antônio Bertachini, do departamento de Mecânica Espacial e Controle do Inpe, esclarece que o lixo espacial é resultante, principalmente, de sobras de missões espaciais. “Quando um foguete leva um satélite para o espaço sobram pedaços de todos os tamanhos, desde um estágio inteiro do foguete de dezenas de quilos a parafusos. Tudo isso que não é utilizado é chamado de lixo espacial”.

Bertachini ressalta que, a cada ano, são adicionados de 70 a 100 satélites no espaço. “No começo da era espacial se lançava um satélite por ano, hoje existem mais de 800. Então, o problema só vai piorando e rapidamente”, alerta.

A constatação também foi feita pela ESA. De acordo com o último relatório da instituição, os quatro mil lançamentos de satélites feitos nos últimos 50 anos produziram mais de 25 mil objetos observáveis, que são maiores do que 10 cm de diâmetro. Desses, 15 mil estão em órbita, mas o “número de partículas menores é ainda maior”, afirma o documento do Debie-1 (primeiro modelo de voo), tecnologia de satélites de pequeno porte dedicada, em parte, a monitorar o ambiente do espaço.

Choque de satélites

O conjunto de objetos em órbita pode oferecer riscos à navegação espacial, especialmente, aos voos tripulados. A consequência disso é a possibilidade de colisões. Mesmo um pedaço pequeno pode fazer um estrago muito grande, porque a velocidade no espaço é muito alta. “Um parafuso pode perfurar um satélite e destruir equipamentos a bordo”, explica Bertachini.

A presença de satélites desativados na órbita terrestre também é uma preocupação. Há pouco mais de um ano, em meados de fevereiro de 2009, o mundo acompanhou as notícias da primeira colisão entre dois satélites artificiais.

O incidente envolveu um satélite ativo dos Estados Unidos e um desativado da Rússia, que não era mais usado desde 1995. A estimativa é de que o choque possa ter gerado 1.500 fragmentos, aumentando consideravelmente o volume dos chamados detritos espaciais.

A ocorrência reacendeu o debate sobre acúmulo de lixo espacial e sobre a necessidade de serem estabelecidas políticas mais efetivas para o registro, medição e monitoramento da órbita da Terra. Desde o lançamento do Sputnik pela antiga União Soviética, em 1957, foram até verificadas outras colisões na órbita terrestre de objetos de grande porte, feitos pelo homem, mas todos de menor peso.

O pesquisador do Inpe reforça que, apesar da colisão ter sido registrada recentemente, existem serviços especializados, como nos Estados Unidos, para rastrear e monitorar os objetos maiores. “E aí é possível saber onde eles estão e tentar evitá-los. Mas pedaços pequenos são muito difíceis de serem detectados. Existe um fator sorte muito grande numa missão espacial. Sempre existe uma chance de ter um problema como esse.”

Segundo Bertachini, a probabilidade de um objeto reentrar na atmosfera e atingir uma pessoa na superfície é muito remota porque quando ele passa pela atmosfera é queimado. “Mas isso já aconteceu. Mesmo assim, como o planeta tem extensa área de oceanos e de regiões de desertos, fica ainda mais reduzida essa possibilidade; mas para os satélites essa é uma ameaça constante”, sustenta.

Controle espacial

O pesquisador Marcelo Souza, do Inpe, ressalta que o controle dos objetos no espaço é feito, hoje, por intermédio de telescópios ópticos e radares. É possível avaliar os objetos com tamanhos acima de 10 cm de diâmetro, inclusive por meio de ilustrações nos sites das agências internacionais. O especialista salienta que a atividade espacial seria viável mesmo sem ter esse monitoramento.

Para ele, a necessidade desse controle ainda é pequena, mas se torna cada vez maior. “O espaço é muito grande o que reduz as chances de colisão em geral. Mas , em algumas órbitas especiais, como a geoestacionária, há maior chance de incidentes pelo maior uso”. Para reduzir os riscos, Souza considera importante incentivar a utilização de outras órbitas e, no Brasil, estimular o interesse pelo assunto nas instituições ligadas à área.

Direito espacial

A discussão sobre a responsabilidade ou ainda sobre as formas para retirar o lixo não avançou muito nos 50 anos da era espacial. Muita coisa já foi pensada, sem soluções concretas ou tecnologicamente viáveis. Entre as ideias mais extravagantes está a de se construir uma imensa rede ou até um veículo espacial para arrastar e coletar o lixo.

Uma das alternativas mais discutidas pelos especialistas é a remoção do satélite de sua órbita antes de deixar de funcionar. Regra adotada na órbita geoestacionária (localizada a 36.700 km no plano da linha do Equador). Essa órbita é considerada importante por abrigar os satélites ligados ao serviço de telecomunicações. “Mas nem todos os satélites têm motor para serem retirados e o lixo espacial é predominantemente de peças”, reforça Bertachini.

O tema ganha espaço em congressos e eventos voltados à discussão de programas espaciais. O Subcomitê Técnico-Científico do Comitê da Organização das Nações Unidas (ONU) para o Uso Pacífico do Espaço Externo (Copous, na sigla em inglês) aprovou uma série de diretrizes, em 2007, para tentar reduzir a incidência de lixo em órbita daqui para frente. O documento foi oficialmente divulgado na 47ª reunião do grupo, realizada de 8 a 19 de fevereiro último, em Viena (Áustria).

A orientação repassada aos países vai desde a limitação dos dejetos espaciais liberados durante o funcionamento dos sistemas espaciais à necessidade de se minimizar os riscos de desintegração, além de realizar a reentrada controlada dos satélites em direção a Terra ao término da vida útil. O diretor de política espacial e investimentos estratégicos da Agência Espacial Brasileira (AEB/MCT), Himilcon Carvalho, destaca entre os temas em debate a importância da maior troca de informações entre agências e operadoras para evitar incidentes e possíveis falhas de comunicação. “Nesse sentido, começa a se discutir até a criação de uma Agência Internacional de Tráfego Espacial”, informa.

Cemitério espacial

O diretor da AEB considera o anúncio das diretrizes para mitigação do lixo espacial um avanço, mas avalia que as recomendações devem ser obedecidas conforme a possibilidade de cada país. “Complicado impor muitas regras para os que estão em desenvolvimento e tentando crescer, como o Brasil e a Índia, onde a atividade espacial ainda é muito cara”, pondera.

Para o chefe da Assessoria de Assuntos Internacionais do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), José Monserrat Filho, as diretrizes representam um passo importante, mas o documento ainda é uma simples recomendação e precisa avançar no aspecto jurídico. Na avaliação do especialista em direito internacional, uma das alternativas para evitar que as centenas de satélites em atividade se transformem em lixo espacial ao fim de suas atividades é programá-los para que eles sigam em direção a outras órbitas.

“Os países estão preocupados com isso porque o lixo está nas órbitas mais utilizadas. Os satélites deveriam ser deslocados para órbitas mais distantes antes do término do combustível”, sugere. “O material usado também deve ser objeto de estudo para que seja de fácil manipulação quando se tornar um lixo espacial”, avalia.

De acordo com Monserrat, as medidas não são tomadas porque são caras e complexas. “Um grande desafio para os países que desenvolvem programas espaciais. Como poderemos garantir a sustentabilidade e segurança dos procedimentos normais com o crescimento em grande escala do lixo espacial?”, indaga.

Ano da Publicação: 2010
Fonte: http://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=lixo-espacial&id=010175100322
Autor: Rodrigo Imbelloni
Email do Autor: rodrigo@web-resol.org

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