A “limpeza do século”, como foi chamado o fim das lixeiras no país, afinal não está a funcionar assim tão bem. Os novos aterros sanitários estão a confrontar-se com mazelas como a falta de tratamento dos lixiviados, a contaminação das águas, os maus cheiros e até incêndios, a que se somam problemas de financiamento, aumento dos resíduos e lentidão na reciclagem. O PÚBLICO revela dados das inspecções feitas nos últimos três anos a essas infra-estruturas e apresenta alguns casos sintomáticos.
Há cerca de um ano, Portugal vivia a ilusão de ter resolvido o problema do lixo. Um total de 341 lixeiras estavam desactivadas. No seu lugar, além de incineradores e centrais de compostagem, foram construídos modernos aterros sanitários. Foi “a limpeza do século”, como exaltou um livro lançado em Fevereiro de 2002 pela “holding” estatal Águas de Portugal, que participa na maior parte dos sistemas de gestão de lixo do país. Os cuidados na construção dos novos aterros, dizia o livro, “garantem a completa inoquidade para o ambiente e saúde das pessoas”. Com isso, cem por cento da população portuguesa estava servida por tratamento adequado para os seus resíduos domésticos.
Relatórios da Inspecção-Geral do Ambiente mostram que o resultado prático não é bem este. Nos últimos três anos – de Dezembro de 1999 a Dezembro de 2002 – foram fiscalizados 27 dos 37 aterros onde hoje se depositam lixos urbanos. E o que os inspectores encontraram foi um rosário impressionante de problemas.
Vinte dos 27 aterros (praticamente três em cada quatro) enfrentavam dificuldades várias com o tratamento dos lixiviados – o líquido poluído que escorre dos resíduos e que é o principal agente de contaminação de um depósito de lixo. Estações de tratamento não funcionavam, lixiviados alagavam células de resíduos, ressurgiam dos taludes e eram descarregados nos esgotos e ribeiras com níveis elevados de poluição.
Em onze aterros, não era possível saber com segurança se as águas superficiais ou subterrâneas estavam livres de poluição, pois a monitorização era deficiente ou mesmo inexistente. Em quatro, identificaram-se situações de contaminação – algumas nitidamente relacionadas com os modernos depósitos de lixo.
Há aterros que receberam indevidamente resíduos perigosos. Outros enfrentaram focos de incêndio que danificaram as telas de impermeabilização. Problemas derivados da forma como o lixo é depositado – como a cobertura deficiente com terra, maus cheiros e presença abundante de aves – também foram assinalados pelos inspectores.
Vários procedimentos legais obrigatórios não estavam a ser cumpridos. Havia furos sem licença, descargas de efluentes sem licença, recebimento de resíduos industriais sem licença, aproveitamento de óleos usados sem licença. O mais surpreendente é que 18 aterros foram inaugurados sem autorização prévia de funcionamento – uma situação entretanto resolvida.
O rol de mazelas dos novos aterros extravasa o retrato pintado pelos relatórios da Inspecção-Geral do Ambiente (ver textos nestas páginas). Alguns sistemas multimunicipais de tratamento de lixo enfrentam dificuldades financeiras porque há autarquias que não pagam atempadamente a factura da deposição dos resíduos nos aterros – de que são donas e clientes, ao mesmo tempo. Com isto, torna-se ainda mais complicado resolver os problemas já existentes. Há muitas lixeiras que efectivamente deixaram de funcionar, mas não foram seladas e continuam a poluir os solos e águas. A quantidade de lixo produzida no país continua a crescer e alguns aterros estão a esgotar-se rapidamente.
Críticas ao governo PS
Para ter um quadro mais preciso do que se passa, o Ministério das Cidades, do Ordenamento do Território e do Ambiente adjudicou, já este ano, uma auditoria a dez sistemas de gestão de lixo (Amarsul, Valnor, Valorlis, Amtres, Algar, Amartejo, Vale do Sousa, Resioeste, Planalto Beirão e Braval). A ideia destas auditorias foi lançad
Ano da Publicação: | 2004 |
Fonte: | Net Resíduos |
Autor: | Rodrigo Imbelloni |
Email do Autor: | rodrigo@web-resol.org |