O saco de presentes (Homem: do lixo ao lixo)

Toda terça feira é dia do carro de lixo passar para recolher os restos das casas. Dentro delas, das casas, é retirado da lixeira dos banheiros: papel higiênico sujo, escova antiga, tufo de cabelo do ralo do banheiro, insetos mortos, incluindo barata esmagada com algo verde estourado pelo pé e limpado com papel higiênico, etc. Do lixo do quarto: diversos papéis, absorventes usados, camisinha usada, bastonetes recheados de cera, pilhas antigas, bateria de celular, pacotes de doces abertos, algumas formigas, escarros cuspidos, etc. E em fim, no lixo da cozinha, na menor lixeira, de duas que há na cozinha: restos de comida, restos de comida que foi a boca, mastigada, triturada e depois cuspida ao lixo, outras baratas esmagas, cuspe com catarro e sangue, pois não é bom cuspir na pia, ainda mais quando a saliva é acompanhada de sangue, pra isso o lixo do lado da pia facilitando. Restos de comida desperdiçada no preparo da comida, papel amassado, pedaços de vidro, uma lata de cerveja amassada, um saco de pipoca de microondas, resto de pão com manteiga e queijo que antes foi derretido e agora fede, etc. No outro lixo da cozinha, o grande, tem uma embalagem de pizza média (R$ 23,00) com restos das bordas desperdiçadas, um saco com o lixo de ontem da lixeira menor com outros diversos desperdícios e lixos da vida moderna, um saco plástico com arroz desperdiçado, arroz que ficou 15 dias na geladeira, coca-cola pet de dois litros vazia, mais vidros de copo quebrado e outros. Isso tudo misturado aos outros lixos, pois esta é a maior lixeira da casa: a grande lixeira da cozinha. A que serve de saco de presentes para o carro de lixo.

Às 8 da noite é posto o lixo na porta da casa.

Toda madrugada de quarta feira, antes do caminhão de lixo passar, um urubu, daqueles que a gente não vê (pois urubu de madrugada só assim, escrito) pousa na intenção do saco de lixo que foi posto na porta de casa. No muro, espia, tenta sentir o cheiro de carniça, mas desta vez nada, nada de carne estragada. Desce perto do saco, com a pata, espia e sente. Nada de carniça. Antes que alguém o veja, alça vôo. Logo em seguida, nada besta, um gato sai da escuridão de uma telha vizinha, pula na rua, sem miar, silencioso. Começa a cheirar o lixo. De vez em quando, não sei se por carência ou por loucura, lambe o saco de lixo. Chegam mais dois gatos. Eles miam, parecem conversar, um deles caga na calçada da casa onde está o lixo. Eles sobem rapidamente no muro e somem na escuridão dum outro telhado. Logo em seguida, vem o sapo. Ele pula, pula. Caminha de quatro com pernas de sapo. Nem liga para o lixo, joga-se no esgoto que flui banhando seu corpo, deliciosamente. E observa. No inicio da rua, três cachorros machos, vira-latas, vêm. Da esquina até a casa onde está o lixo ouvem-se os latidos dos outros cachorros que estão nas garagens e quintais dos seus donos. Os vira-latas nem latem, mexem com um a um dos lixos que estão na rua. Até chegaram ao lixo que foi posto na porta da casa. Ele cheira e nada. Um deles sorri. Sim, incrivelmente eles sorriem quando não tem a presença humana. Outro, do grupo, cheira o lixo com mais atenção e identifica as bordas da pizza, mas antes que ele lata para os companheiros, uma cadela passa na esquina. Os três sentem o cheiro de cio ao longe, espiam e de vez vão sorridentes.

Dez minutos depois, um homem, que está com um saco já cheio de sobras e restos, mexe no lixo que está à frente da casa. Ele, sabiamente, em pouco tempo, acha as bordas desperdiçadas da pizza. Encontra também um short de marca, rasgado e com várias costuras antigas de outros rasgões. Ele, feliz com os achados, come duas bordas duma só vez. Antes que siga, vê o sapo na poça. Ele, com os olhos esbugalhados para o sapo, com perspicácia, o pega com as mãos. O homem, com força com fome sem pena, lixo, humano, aperta o sapo até a morte e segue, salivando a refeição.

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ASS: José Augusto Sampaio – Redator Publicitário, Escritor e louco pela vida.
e-mail: guto.sampaio83@gmail.com
BLOG pessoal: http://joseaugustosampaio.blogspot.com/
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Ano da Publicação: 2009
Fonte: http://45graus.com.br/diasnormais/36588/leia_o_saco_de_presentes_homem_do_lixo_ao_lixo.html
Autor: Rodrigo Imbelloni
Email do Autor: rodrigo@web-resol.org

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