questão do lixo vem sendo apontada pelos ambientalistas como um dos mais
graves problemas ambientais urbanos da atualidade, a ponto de ter-se tornado objeto de
proposições técnicas para seu enfrentamento e alvo privilegiado de programas de educação
ambiental na escola brasileira. A compreensão da necessidade do gerenciamento integrado
dos resíduos sólidos propiciou a formulação da chamada Política ou Pedagogia dos 3R‘s2,
que inspira técnica e pedagogicamente os meios de enfrentamento da questão do lixo.
No entanto, apesar da complexidade do tema, muitos programas de educação
ambiental na escola são implementados de modo reducionista, já que, em função da
reciclagem, desenvolvem apenas a Coleta Seletiva de Lixo, em detrimento de uma reflexão
crítica e abrangente a respeito dos valores culturais da sociedade de consumo, do
consumismo, do industrialismo, do modo de produção capitalista e dos aspectos políticos e
econômicos da questão do lixo. E a despeito dessa tendência pragmática, pouco esforço tem
sido dedicado à análise do significado ideológico da reciclagem, em particular da lata de
alumínio (material que mais se destaca entre os recicláveis), e suas implicações para a
educação ambiental reducionista, mais preocupada com a promoção de uma mudança
comportamental sobre a técnica da disposição domiciliar do lixo (coleta convencional x
coleta seletiva) do que com a reflexão sobre a mudança dos valores culturais que sustentam
o estilo de produção e consumo da sociedade moderna.
Essa prática educativa, que se insere na lógica da metodologia da resolução de
problemas ambientais locais de modo pragmático, tornando a reciclagem do lixo uma
atividade-fim, ao invés de considerá-la um tema-gerador para o questionamento das causas
e consequências da questão do lixo3, remete-nos de forma alienada à discussão dos aspectos
técnicos da reciclagem, evadindo-se da dimensão política.
Analisando-se a literatura a respeito da interface entre a educação ambiental e a
questão do lixo, observa-se uma excessiva predominância da discussão a respeito dos
aspectos técnicos, psicológicos e comportamentais da gestão do lixo, em detrimento de seus
aspectos políticos. A discussão conduzida pela educação ambiental está consideravelmente
deslocada do eixo da formação da cidadania enquanto atuação coletiva na esfera pública, já
que há um expressivo silêncio no que se refere à implementação de alternativas para o
tratamento do lixo por intermédio da regulação estatal ou dos mecanismos de mercado.
Além disso, a questão do lixo, nas suas variadas facetas, ainda não se tornou objeto de
demanda social específica pela criação de políticas públicas, a exemplo das lutas
socioambientais já consolidadas em alguns movimentos sociais. As dispersas e isoladas
iniciativas de criação de cooperativas de catadores de lixo, por exemplo, ainda não
alcançaram uma articulação ampla e coesa o suficiente para transformar essa atividade em
política pública. É, então, na tentativa de resgatar o significado político-ideológico da
reciclagem que apresentamos a presente reflexão.
De acordo com Sewell (1978), as crescentes objeções ao volume de resíduos sólidos
dividem-se em cinco categorias: saúde pública, custos de recolhimento e processamento,
estética, ocupação de espaço em depósitos de lixo e esgotamento dos recursos naturais. Mas
a discussão que inaugura o debate a respeito da Coleta Seletiva de Lixo como uma
alternativa tecnológica para o tratamento dos resíduos sólidos baseia-se no panorama da
saturação dos depósitos de lixo: a cada ano, avolumam-se as dificuldades que os municípios
encontram para a destinação final do lixo. Problemas de ordem política e técnica tornam a
coleta convencional de lixo cada vez mais onerosa, a ponto de favorecer o surgimento da
tecnologia baseada na coleta seletiva, complementar à coleta convencional. Um fator
adicional ao surgimento da Coleta Seletiva de Lixo é a constatação da possibilidade de
esgotamento dos recursos naturais, sobretudo dos não-renováveis: segundo projeções
futuristas de alguns especialistas, em especial do controvertido Clube de Roma (Meadows
et al, 1978), o uso de certos recursos minerais pode provocar um colapso em curto espaço
de tempo, se as tendências na exploração mineral não forem alteradas.